Que outro jornalista teria o privilégio de ser interpretado por dois astros como Jason Robards e Tom Hanks? Só mesmo Ben Bradlee, personagem de Todos os Homens do Presidente, de Alan Pakula, e do recente The Post – a Guerra Secreta, que concorre ao Oscar dia 4 de março. Benjamin Crowninshield Bradlee foi mesmo uma grande figura, como se pode comprovar no documentário Homem de Jornal: a Vida de Ben Bradlee, de John Maggio (na HBO).
De família e porte aristocráticos, o jovem Bradlee foi formado na cultura puritana de Boston. Ele mesmo diz que se casou com a primeira moça que namorou. Teve poliomielite na infância, superou-se, virou atleta, esteve na guerra, acumulou experiência e retornou são e salvo aos Estados Unidos. Então tirou a sorte grande ao ser convidado como correspondente da revista Newsweek em Paris.
Paris é sempre um banho de civilização para quem sabe aproveitá-la. Ainda mais a Paris do pós-guerra, quando Sartre, Simone de Beauvoir e Albert Camus podiam ser encontrados nos cabarés ouvindo Juliette Gréco. O jovem Bradlee voltou da Europa mais culto e mais aberto. Regressou também com esposa nova, que conhecera nos embalos tanto da Rive Gauche quanto da Rive Droite.
O filme o mostra na vida mundana e deliciosa dos anos de ouro, em festas, flertando com as damas e cultivando amizade íntima com os Kennedy. Mesmo depois de John Kennedy ser eleito, a amizade continuou, apesar de o priápico presidente dar em cima da esposa do amigo de um jeito que, hoje, lhe custaria processo por assédio.
A celebridade de Bradlee vem de duas coberturas sensacionais bancadas por ele no tempo em que era editor do The Washington Post. divulgação dos Papéis do Pentágono abalou o governo de Richard Nixon e o Caso Watergate acabou por derrubá-lo. Os casos são narrados pelo próprio Bradlee e também por seus protagonistas, os repórteres vedetes Bob Woodward e Carl Berstein. O próprio Henry Kissinger, então Secretário de Estado, vem dar seu pitaco.
O documentário aborda as diversas facetas de Bradlee, do sedutor ao implacável homem de jornal, em estado permanente de “busca da verdade”. Ouvimos tudo de sua própria voz: do seu grande êxito nos dois momentos maiores de sua carreira ao ponto mais baixo, quando o Post publicou uma série de reportagens indicada ao Pulitzer que, comprovou-se, haviam sido forjadas pela repórter. Do limão azedo, o Post fez uma limonada pouco usual na imprensa: assumiu o engano em matéria de capa seguida de quatro páginas internas. Reconheceu que a culpa era não apenas da repórter, mas do jornal, por não ter feito uma checagem rigorosa das informações. Foi um exemplo de transparência.
No sucesso como no declínio Bradlee comportou-se com elegância, como parece dizer este belo documentário sobre um jornalista old school que, soldado exemplar, fez muito mais do que exigia o seu dever.