Veneza, de Miguel Falabella, participou do Festival de Gramado de 2019, o último antes da Peste. Agora, entra em cartaz. Na ocasião, escrevi o seguinte:
(…) Com Veneza, entramos no domínio do sonho, mas ainda não de forma imediata. Carmem Maura faz uma mulher idosa, dona de bordel, cega e à beira da morte. Amada por suas “meninas”, ela revela seu último sonho: conhecer Veneza e lá encontrar seu amor de juventude.
Na maneira como o senti, o filme demora a engrenar, mas essa espera, na verdade, prepara um desfecho glorioso. Impossibilitadas de levar a Gringa (Maura) à cidade italiana, as mulheres (Dira Paes, Carol Castro, Danielle Winits) e o homem do bordel, Tonho (Du Moscovis), preparam uma “viagem possível”, no plano do imaginário, para satisfazer o desejo da velha senhora.
O filme é baseado na peça Venecia, de Jorge Accame e, deve-se dizer, escapa à dimensão teatral, virando cinema pela magia da fotografia de Gustavo Habda, um craque.
É curioso como aproxima duas dimensões do sonho, duas artes antigas, a do bordel e a do circo, nos quais a imaginação tem papel tão fundamental.
Afinal, é pelo circo que a dona do bordel poderá realizar seu desejo. No fundo um desejo terminal, o de conhecer uma cidade que é também a dos sonhos, Veneza, e o reencontro (impossível na realidade) de um amor rompido há mais de 50 anos
Essas confluências todas, juntadas à ária E Lucevan le Stelle, da Tosca, de Puccini, colocam o filme num patamar que não poderíamos prever em seu início hesitante.