CURITIBA – O Olhar de Cinema começou sob bons augúrios da boa surpresa. Chegamos muito adiantados para o início da primeira sessão da tarde e sem fome ainda para o almoço. Como matar o tempo? Olhei a programação e vi que havia um filme relativamente curto, chamado Rewind & Play, de Alain Gomis. Assunto? Monk, o grande, imenso Thelonious Monk. Estou dentro.
O ano é 1969 e Thelonious chega a Paris para uma série de concertos, em companhia de sua esposa Nelly. Antes, grava um programa para TV. O que temos são as imagens brutas dessa tentativa de gravação em que o especialista francês em jazz tenta, em vão, arrancar alguma declaração do pianista.
Monk fala por monossílabos. Às vezes repete, nas respostas, o que havia sido articulado pela pergunta. O apresentador frustra-se. Manda apagar a fita, começar de novo. Por sorte, o material foi preservado e serve de base para esse doc incrível de bastidores.
O apresentador tenta lembrar da primeira turnê de Monk na França, quando ele ainda não era muito conhecido na Europa. Desta vez, a resposta vem completa. Monk se queixa de que os organizadores não haviam contratado músicos para acompanhá-lo. Teve, ele mesmo, de fazê-lo, e pagar os acompanhantes do próprio bolso. “Eu era o que menos recebia”, diz. O apresentador manda apagar. A resposta é inútil “porque difamatória”. E assim vai.
Também por sorte, há um piano na sala. Monk senta-se na banqueta e começa a experimentar o Steinway & Sons. Aquelas mãos enormes e delicadas deslizam sobre o teclado. Começam a articular sons, melodias, ritmos, harmonias e modulações imprevistas. Magia pura. A câmera detêm-se nas mãos e, em super close, desloca-se para o rosto suado do músico. Gênio absoluto.
Lá onde a palavra mostra limitações, a música se impõe.