Breves comentários sobre os indicados a melhor filme no Oscar-2023


  • Algumas linhas sobre os indicados a melhor filme no Oscar 2023, em ordem decrescente de preferência.
  • Tár. Um raro filme adulto, o que não o favorece. Mescla a reflexão sobre o poder, questões de gênero e cancelamento a uma atuação de sonho de Cate Blanchett. Tida como favorita, Cate talvez não ganhe por ser  uma mulher branca, além de sua personagem parecer antipática para parte do público. Além disso, o filme se desenvolve com nuances, mesclando zonas claras e sombrias, e até se arriscando em discussões intelectuais em torno da música dita erudita. Tais características, que antes seriam trunfos da obra, agora talvez pareçam pernósticas e elitistas.

    Os Banshees de Inisherin. Propõe-se como uma alegoria sobre como começam as guerras, com a história de uma velha amizade desfeita sem motivo verossímil. Linda fotografia, dois atores muito bons, além de outras qualidades, são prejudicadas pela metáfora radical de um dos personagens cortar os dedos da própria mão caso não seja atendido. É mais um bom filme perdido por não confiar na capacidade de entendimento do espectador. Acha que deve enfiar-lhe “mensagens” às marteladas.

    Nada de Novo no Front. Filme de guerra duro, realista, talvez em diálogo oculto com uma obra-prima do gênero, Vá e Veja, de Elem Klimov. É a terceira adaptação para a tela do romance de Erich Maria Remarque, considerado um clássico da literatura antibelicista e baseado na experiência do próprio autor durante a Primeira Guerra Mundial. A primeira em alemão, o que lhe confere o ponto de vista do autor do livro.

    Triângulo da Tristeza. Se a intenção era pintar como caricatura o mundo ridículo dos super-ricos, e estabelecer sua relação ambígua com os “subalternos”, o filme cumpre sua missão. Mas não precisava ser tão apelativo nem tão óbvio e caricato em certas sequências. Estas só o enfraquecem. É um cinema de ideias, só que trabalhadas de maneira tosca, pelo menos neste caso. Num comentário de Facebook, o filósofo Renato Janine Ribeiro aproximou o filme à dialética entre senhor e escravo, de Hegel. Faz sentido.

    Os Fabelmans. Filme autobiográfico de Steven Spielberg, que parece muito simples, mas acaba ressoando tempos depois. O cinema como descoberta da beleza mas também do trauma, os conselhos do velho tio de passagem pela casa sobre a natureza terrível da arte, a câmera como arma da ironia (ao entronizar o desafeto para melhor ridicularizá-lo), o encontro do jovem candidato a cineasta com o mito John Ford – são sequências que permanecem no espírito.

    Elvis. Uma cinebio correta do astro do rock, cheia de música e fúria, que chega a entusiasmar em alguns momentos. Em benefício do filme, o diretor, desta vez, modera excessos que costumam poluir sua obra.

    Top Gun Maverick. Aventura à moda antiga, divertida e bem filmada, sua índole colonialista o torna insuportável. Noto que seus fãs, mesmo entre críticos, não dão a mínima para esse aspecto, como se um filme fosse algo neutro, sem qualquer outra consequência que não o entretenimento imediato.

    Entre Mulheres. A importância do tema – a opressão sobre as mulheres – não pode ser posta em dúvida, porém a realização cinematográfica mostra-se muito fraca. Mulheres oprimidas e estupradas de uma comunidade religiosa têm de decidir o que fazer enquanto os homens não voltam da prisão, para onde foram enviados por suas violações. A estrutura teatral e a repetição dos diálogos torna-o muito maçante.

    Avatar. Essa sequência é pura enrolação para preencher suas mais de três horas de duração. O conteúdo é mínimo e, no mais, são lutas, lutas e mais lutas, em terra, mar e ar. E vem mais duas pela frente, porque a franquia rende um dinheirão.

    Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo. Pelas premiações dos sindicatos, entra como favorito aos prêmios principais, o que não deixa de ser surpreendente mesmo para os que mantêm alguma consciência do mundo em que vivem. Obra caótica, infantilóide e de desfecho sentimental, talvez sirva como termômetro de uma época caracterizada pelo desejo de escapismo e profunda desagregação cognitiva. Que esta fragmentação do pensamento ocorra numa época de rápido desenvolvimento tecnológico, é um paradoxo digno de todo interesse. Já o filme nos mergulha numa experiência de tédio das mais radicais.

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